“Só existe a beleza que se diz. Só existe a beleza se existir interlocutor. A beleza da lagoa é sempre alguém. Porque a beleza da lagoa só acontece porque a posso partilhar. Se não houver ninguém, nem a necessidade de encontrar a beleza existe nem a lagoa será bela. A beleza é sempre alguém, no sentido em que ela se concretiza apenas pela expectativa da reunião com o outro.”
Esse trecho do autor Valter Hugo Mãe me faz pensar na importância do outro na construção de significado e beleza na vida. Associei isso também com a escuta. Uma boa escuta disponível para ouvir o que o outro tem a dizer, é o que possibilita a construção de sentidos. Quando sou capaz de contar o que vejo e vivo, crio um sentido.
Parece pouca coisa, mas nao é.
Basta imaginar episódios em que nos deparamos com aquilo que não tem sentido algum. Experiências traumáticas e difíceis costumam nos deixar sem capacidade de dar sentido. Sem palavras. Sem como contar. Sem ter o que dizer. A psicanalista Maria Rita Kehl em seu livro “O tempo e o cão” compartilha a ideia de que o trauma destrói, pelo menos em parte, o valor da experiência. Sem ter o que narrar, sem ter o que dizer, o que foi vivido perde seu valor. No caso da depressão, em grande parte, é esse nosso maior trabalho. Recuperar o sentido. Trabalhar a capacidade de encontrar valor naquilo que está sendo vivido.
É assim que começamos a compreender um trauma, quando algo que é vivido fica sem elaboração, fica para ser assimilado depois. Um resto que guardamos em um lugar protegido, que dificulta lembrar, falar sobre, pensar sobre. É nesse contexto que encontramos sujeitos em profundo sofrimento em seus laços e que apresenta barreiras na capacidade de realizar (coisas) e amar. Construir uma significação para o que vivemos passa pelo encontro com um outro, é preciso que haja esse encontro. Em experiências traumáticas, se faz ainda mais fundamental a presença de um outro, terceiro, que possa reconhecer o sofrimento e mediar para que o ocorrido tenha algum sentido e seja elaborado psiquicamente. E aqui dá pra entender um pouco da função do analista em uma análise: levar os sujeitos a esse lugar que algumas coisas foram guardadas e não foram pensadas ainda.
Hannah Arendt escreveu assim “Toda dor pode ser suportada se sobre ela puder ser contada uma história”. E acho que essa frase é uma boa finalização pra isso que escrevi aqui.